segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Depois de Fran



Se me dissessem que a língua dói mais que um punho alguns anos atrás eu não acreditaria. Hoje, com a tecnologia e quase nenhuma privacidade no mundo moderno, acho que mesmo um vídeo dói mais que a palavra e o punho.

Mais um caso de uma agressão psicológica por meio de uma filmagem. Um boquete. A palavra cu. Boca que todo mundo tem, cu que todo mundo tem, pau que metade do mundo tem. Um boquete que todo mundo já fez ou já ganhou. Um cu que todo mundo já viu. Mas a dor não é de todo mundo, a dor é da Fran.

Fran é uma moça maior de idade que confiou num cara. Ele a traiu. Ela lambeu o pau do sujeito e ele se achou no direito de expor isso para o mundo, porque afinal, se ela fez sexo com ele, ela merece ser apedrejada por palavras hostis e humilhações. Vou morrer sem entender o que se passa na mente de um cara que vê sexo dessa forma. 

Todas nós fomos Fran um dia. Quase todas nós olhamos pra uma câmera e lambemos um pau, ou mandamos uma foto dos nossos peitos; todas nós confiamos, porque nos disseram que os homens não são todos iguais. Fran não teve a minha sorte e talvez não a sua. 

Fran está sendo humilhada por querer sentir e dar prazer. Por ser humana. 

São poucos os filmes que me deixam parada no mesmo lugar depois de terminar. Um deles foi Depois de Lúcia, que conta a história de uma garota que sofre bullying na escola depois ter um vídeo dela fazendo sexo divulgado na internet. Nada acontece com o rapaz que ligou a câmera do celular, mas ela é espancada, humilhada, estuprada e até mijam nela. Porque ela trepou na frente da câmera. Simples assim. 

A história em Depois de Lúcia é a história de Fran. É a história de Amanda, de Cláudia, Luciana, Regina, Ana, Rebeca, Júlia, Laura. As mulheres humilhadas por serem humanas e treparem na frente de uma câmera têm mil nomes e a mesma história de confiança quebrada. Cada uma delas poderia estrelar um filme sobre a sua dor e as consequências devastadoras dessa exposição em suas vidas. 

Ninguém sabe o nome do dono daquele pinto no vídeo. É engraçado como os homens que participam do sexo não são culpabilizados porque afinal, "homem é assim mesmo". Homem gosta de sexo, né? Mulher não. Homem gosta de comer cu, mas mulher não gosta de dar e, se gosta, é puta e merece ser apedrejada.

O direito de existir como um ser complexo que sente tesão e que quer sim dar o cu e fazer um boquete não existe para a mulher. Não existiu para Alejandra em Depois de Lúcia e não existiu para Fran. O que mais me entristece é ver que por mais que essa mesma história de humilhação e desrespeito seja recontada, mais mulheres como Fran vão aparecer: destruídas por terem confiado em alguém o suficiente para apertar o REC. 

Chega de punir mulheres por serem sexuais, por terem desejos e vontades. Por gostarem da câmera e gozarem com ela. Já passou da hora de aprender. 

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